James Purefoy foi apresentado, em conferência de Imprensa, como o actor que usaria a máscara do terrorista ‘V’, personagem central de ‘V de Vingança’, filme baseado na famosa banda desenhada de Alan Moore e David Lloyd. A poucas semanas do início das filmagens, desistiu do papel, justificando-se: “A máscara do Homem Aranha sai, a do Batman sai. Até o Homem Elefante tem olhos. Era tudo o que pedia, um olho.”
Mas não há indícios de um rosto humano em ‘V’. Apenas o que nos conta a máscara: é a face de Guy Fawkes, o terrorista católico que, a 5 de Novembro de 1605, foi apanhado na cave do Parlamento com 36 barris de pólvora prontos a explodir para assassinar James I, rei que favorecia os protestantes. A conspiração falhou, mas a data ainda hoje é celebrada na “noite das fogueiras” (acesas então para celebrar a segurança do rei) e todos os anos, por tradição, as caves do Parlamento são passadas em revista no dia da abertura.
‘V’ utiliza Guy Fawkes como totem para os seus propósitos revolucionários. Mas o actor sem rosto não é James Purefoy, que não aguentou estar escondido durante todo o filme. Algo que Hugo Weaving, cuja voz reconhecemos imediatamente da trilogia ‘Matrix’, não fosse ele o pérfido agente Smith, viu como um desafio: “Entendo James, pois sentimo-nos como que… anulados. É a voz e os gestos que têm de representar.”
ANULAR O ACTOR
Nos anos 70, foi o terror, casos de ‘Sexta-Feira 13’ ou ‘Halloween’, a criar o fascínio das máscaras, mesmo através de algo tão ridículo como a protecção facial dos guarda-redes de hóquei no gelo. O portador perde identidade própria por troca com a do objecto, um pouco como acontece a Jim Carrey em ‘A Máscara’.
Para David Prowse, essa transferência foi vivificante. Afinal, foi ele quem vestiu a pele de Darth Vader na primeira trilogia de ‘A Guerra das Estrelas’, o que lhe valeu grupos de fãs e convites para inúmeras conferências até hoje. Já a voz cavernosa de Anakin Skywalker pertencia ao actor James Earl Jones.
Nos últimos anos, as máscaras voltaram a estar na moda em Hollywood, muito por culpa das adaptações de ‘comics’ de super-heróis ou de personagens como Zorro e o Fantasma da Ópera. Nestes casos, tratam-se de transferências parciais, pois o rosto não se anula completamente ante o ícone.
O mesmo não se passou com Edward Norton em ‘Reino dos Céus’, que levou o efeito de anulação ao limite com a máscara que escondia a lepra do Rei Balduíno IV. O conhecido actor nem sequer quis o seu nome nos créditos do filme.
A tentativa de Hugo Weaving em humanizar uma máscara é digna de registo, embora tenha faltado uma voz não tão reconhecível de outros filmes. Natalie Portman tem o seu quinhão de boa actuação, mas é traída pela montagem asséptica, que pouco valor dá à construção psicológica das personagens. Fez-se um filme de acção e como tal não aborrece muito.
Os apreciadores da banda desenhada só podem sentir-se defraudados com a plasticidade da adaptação, uma espécie de pastilha elástica com toques incoerentes de ‘Matrix’, filme que James McTeigue serviu como assistente de realização. Em ‘V de Vingança’, não foi além da máscara, ou seja, privilegiou a forma numa obra onde o conteúdo, a mensagem, é tudo.
O REGRESSO DOS IRMÃOS
Desapareceram da vida pública após realizarem o capítulo final da trilogia ‘Matrix’, que lhes valeu tanto dinheiro quanto críticas, mas os irmãos Wachowski, Andy e Larry estão de volta como escritores do argumento de ‘V de Vingança’, no qual já tinham trabalhado no início dos anos 90, pois sempre foram grandes apreciadores da banda desenhada. A carreira meteórica dos manos começou com a escrita de ‘Assassinos’ (1995) – filme que renegam devido às alterações feitas à posteriori no guião – e a realização de ‘Bound – Sem Limites’ (1996), que lhes haveria de proporcionar o financiamento necessário para ‘Matrix’.
Alan Moore está para a banda desenhada como Steven Spielberg para o cinema: é um génio inovador na técnica e linguagem. O criador de ‘V for Vendetta’ tem, no entanto, uma péssima relação com as adaptações das suas obras para o grande ecrã: “Desde que eu não as veja...” É o caso de ‘A Liga dos Cavalheiros Extraordinários’ (2003), que o levou a Tribunal. Moore não detém os direitos de todas as bandas desenhadas que escreveu e prefere que o seu nome nem sequer apareça nos créditos. ‘From Hell – A Verdadeira História de Jack, o Estripador’ (2002) ou ‘Constantine’ (2005) são exemplos do quanto odeia o que o cinema fez com a sua obra.
Alan Moore iniciou o argumento de ‘V for Vendetta’ no Verão de 1981, durante as férias na ilha de Wight e a série, desenhada por David Lloyd, surgiu em 1982 na revista ‘Warrior’, cuja publicação descontínua fez com que só fosse terminada no Inverno de 1988. Moore queixa-se de inexperiência política nos primeiros episódios, caso da noção de que poderia haver sobreviventes numa guerra nuclear. No entanto, em 1988, a Inglaterra fascista que criara pareceu-lhe próxima com o início do terceiro mandato de Margaret Tatcher. “Estou a pensar levar a minha família para fora do país”, escreveu no prefácio do livro que reuniu todos os capítulos.
Título original: ‘V for Vendetta’
Realizador: James McTeigue
Argumento: Andy e Larry Wachowski, baseado na banda desenhada de Alan Moore e David Lloyd
Intérpretes: Natalie Portman (Evey), Hugo Weaving (V), Stephen Rea (Finch), John Hurt (Sutler)
Natalie Portman teve de rapar o cabelo durante as cenas da tortura. A actriz afirmou que já tinha a intenção de experimentar esse ‘look’.
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